"Ó crentes, está-vos prescrito o jejum, tal como foi prescrito a vossos antepassados, para que possas aprender Taqwad.” Surata 2.183, Alcorão
Ao longo deste mês de setembro, um bilhão de pessoas que professam o islamismo praticou o jejum do Ramadã, um dos cinco pilares da religião islâmica. Muito se poderia dizer sobre esse mês, mas este artigo quer levantar pontos positivos desta prática que podem nos trazer um ensinamento importante para nossa vida cristã.
O versículo citado acima fala de Taqwad, palavra que significa “consciência de Deus, piedade, autocontrole”. No nono mês do calendário lunar, usado pelos muçulmanos, a prática do jejum tem o objetivo de desenvolver o autocontrole e maior consciência sobre Alá.
Há uma preocupação de não tornar essa prática apenas um ritual vazio, sem utilidade. Há um objetivo de transformação. Um hadith (frase do profeta Maomé) diz: “Daquele que não pára de mentir e praticar falsidades, Alá não necessita que abra mão de comida e água”. Há uma relação direta entre a prática do jejum e o fortalecimento espiritual, além de prover ao indivíduo uma oportunidade de se ter uma relação intimista com o seu Deus.
Outro aspecto interessante é a niyyah, que significa “intenção”. Os muçulmanos não devem simples ou acidentalmente se abster da comida. Eles devem atingir a condição da niyyah. Para executar essa exigência, um muçulmano deve propor em seu coração que o jejum signifique uma adoração somente a Alá. Dessa forma, se alguém jejua por razões políticas ou por regime alimentar, essa pessoa não realizaria a niyyah. De acordo com as escrituras islâmicas, “quem não faz niyyah antes do amanhecer, não deveria ter jejuado”.
Pode-se notar que por traz da prática do jejum durante o Ramadã, há uma preocupação no desenvolvimento espiritual, que leva o seu praticante para mais próximo de Deus, se esta for sua intenção. Caso contrário, não passa de um ritual vazio e inútil.
Houve, por parte de Jesus, a mesma preocupação. Ao ensinar aos seus discípulos sobre oração e jejum, ele ressaltou o aspecto intimista do ato e não o uso dessa prática para exaltação do ser: “Quando vocês orarem, não sejam como os hipócritas. Eles gostam de orar de pés nas sinagogas e nas esquinas das ruas para serem vistos pelos outros. Mas você, quando orar, vá para o seu quarto, feche a porta e ore ao seu Pai, que não pode ser visto. E o seu Pai, que vê o que você faz em segredo, lhe dará a recompensa.Quando vocês jejuarem, não façam uma cara triste como fazem os hipócritas, pois eles fazem isso para todos saberem que eles estão jejuando. Mas você, quando jejuar, lave o rosto e penteie o cabelo para os outros não saberem que você está jejuando. E somente o seu Pai, que não pode ser visto, saberá que você está jejuando. E o seu Pai, que vê o que você faz em segredo, lhe dará a recompensa.” Mateus 6.5-6;16-18
A prática de disciplinas espirituais, como oração e jejum, devem ser exercidas pelos discípulos de Cristo em sua forma mais íntima possível. Não se pode utilizar de práticas religiosas para autopromoção ou para a busca de reconhecimento público por seus feitos e nem mesmo alcançar a misericórdia de Deus por atos praticados em nome da religião.
“É pela graça que sois salvos”, disse Paulo.
Não há dúvidas de que a intenção (niyyah) da prática do jejum do Ramadã deveria ser imitada também por nós cristãos, que muitas vezes, nos vemos em práticas religiosas vazias sem qualquer niyyah.
No entanto, a semelhança com a prática islâmica se encerra aqui, pois, diferentemente do que prega o islã, o Novo Testamento nos ensina que é pela graça de Deus que obtemos nossa justificação e não por nossos próprios esforços. Enquanto os muçulmanos estão praticando seus cinco pilares com incertezas de alcançarem a misericórdia de Alá, qualquer um pode obter a certeza da salvação de seus pecados na confiança do sacrifício único e completo de Cristo Jesus na cruz – “por suas pisaduras fomos sarados” escreve Isaías.
Não é mérito nosso. Não há nada que possamos fazer para obter o favor de Deus, exceto admitir a nossa total incapacidade de alcançarmos a salvação por nossos próprios esforços, nos humilhar diante da Cruz, aceitar a graça de Deus em nos salvar e reconhecer o seu amor por nós em providenciar tudo.
Portanto, nossa prática religiosa não deve ser uma atitude para aplacar a ira de Deus e sim, uma demonstração de que reconhecemos seu senhorio sobre nossas vidas e que cada ato, palavra ou gesto deve ser uma expressão de gratidão a Deus pelo que Ele fez pelo ser humano. Não uma relação de medo, mas uma relação de amor. Não uma relação de um mortal com um Deus irado e distante, mas uma relação de Pai para filho.
“Mas, a todos quantos o receberam (Jesus), deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus, a saber, aos que crêem no seu nome.” João 1.12
Fim do Ramadã! Como resultado de um mês de jejum e orações muitos muçulmanos estarão mais fortalecidos em sua fé, com mais certeza de que estão no caminho certo e ainda com mais vontade de ver o mundo inteiro servindo a Alá. E para nós cristãos, qual terá sido o resultado final do Ramadã? Será que estamos também tão convictos de que queremos ver o mundo todo servindo ao Senhor Jesus Cristo? E o que temos feito a respeito?
Até o próximo Ramadã,
Assalam Aleikum
Carlos Alfredo de Sousa
Biblografia:
http://islamicchat.org/ramadan.html
http://islamicchat.org/jejum.html
http://pessoas.hsw.uol.com.br/ramada2.htm
Demant, Peter. O Mundo Muçulmano. São Paulo: Contexto, 2004.
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