Um novo estudo, mostrando a relação intrínseca entre religião e moralidade, foi divulgado em abril mostrando que a maneira como vemos a Deus influencia nossa honestidade.
O estudo, intitulado Mean Gods Make Good People: Different Views of God Predict Cheating Behavior [Deuses maus geram pessoas boas: diferentes visões sobre Deus ajudam a prever comportamento e trapaças] foi publicado mês passado na Revista Internacional de Psicologia da Religião. O levantamento foi cooordenado pelo psicólogo americano Azim Shariff, da Universidade do Oregon, e a canadense Ara Norenzayan, da Universidade da Columbia Britânica, que já publicaram pesquisas semelhantes no passado.
“A questão mais importante do que acreditar ou não em Deus, é o tipo de deus que uma pessoa crê”, explica Azim Shariff.
Acreditar em Deus não impede as pessoas de trapacearem, a menos que ele seja visto como alguém capaz de punir. A pesquisa foi conduzida entre estudante universitários submetidos a um teste simples de matemática em um computador. Todos foram avisados que uma falha no sistema poderia mostrar as respostas na tela a menos que eles apertassem a barra de espaço antes. O computador calculava quanto tempo depois de ver a resposta na tela os alunos digitavam a ou a mudavam após saber o resultado esperado. Esses alunos foram entrevistados individualmente sobre suas crenças religiosas e, aqueles que criam, tiveram de explicar qual o seu conceito de Deus.
Os resultados demonstram que há uma relação entre a crença religiosa e a honestidade, mas não se trata de simplesmente afirmar que “os mais religiosos trapaceiam menos”.
“Na comparação entre crentes e descrentes, não encontramos nenhuma diferença significativa… Mas entre os que acreditam, a visão de um Deus irado e punitivo parece levá-los a um índice menor de trapaça. Por outro lado, os que crêem em um Deus que perdoa e conforta, tendem a trapacear mais. Esses efeitos permaneceram após termos feito o controle estatístico, retirando outras variáveis como raça e classe social”, explica Shariff.
Essa relação entre a visão de um Deus punitivo e o grau de honestidade não surpreendeu os pesquisadores, pois o resultado parece acompanhar a teoria conhecida como “a hipótese da punição supernatural”. A surpresa está no outro lado da questão.
“O aumento no nível de trapaça associado a ideia de um Deus amoroso surpreende, pois não tínhamos como prever que isto aconteceria. No entanto a pesquisa corroborou a descoberta de que um acreditar em um Deus que perdoa e é amoroso parece levar a um aumento nos níveis de trapaça”, afirmou Shariff.
O trabalho deve agora se expandir para outros tipos de comportamento moral. “Uma questão importante a ser investigada é se a diferença entre Deus punitivo e bondoso se estende para outros tipos de comportamento moral como caridade e generosidade ou se é específico para o caso da trapaça. É bem possível que um Deus punitivo seja efetivo apenas para impedir as pessoas de fazer coisas ruins […]. Nos outros casos (generosidade e caridade) é possível que um Deus bondoso tenha um efeito positivo pois pode servir de exemplo de benevolência e estimular as pessoas a copiá-lo”, afirmou Shariff. E completou: “O fato é que, neste momento, não temos esta resposta, mas esperamos descobri-la”
Shariff acredita ainda que tem havido um onda recente de pesquisas acadêmicas sobre o comportamento relacionado a religião, especialmente desde os ataques de 11 de setembro, e à luz do conflito “evolução versus criacionismo”.
“É importante estudar a ciência nesses debates. Ele fornece uma ferramenta poderosa para estudar a religião, que é uma força poderosa no mundo”, disse Shariff. ”O melhor da psicologia é visto quando se estuda as coisas pelas quais as pessoas são apaixonadas”.
Por exemplo, o Fórum Pew sobre Religião e Política Pública foi lançado em 2001 para atender a necessidade de mais pesquisas sobre os efeitos da religião na sociedade. Só a conceituada Universidade Baylor, do Texas, hoje tem seis professores especializados em sociologia da religião e um programa de doutorado nesta área.
Um livro lançado no final do ano passado pelos sociólogos Paul Froese e Christopher Bader, America’s Four Gods — What We Say About God and What That Says About Us [Os quatro deuses da América – O que podemos dizer sobre Deus e que isso diz sobre nós], analisa como os diversos conceitos de Deus afetam a nossa visão de mundo. O livro foi baseado em diferentes pesquisas com mais de 4.000 pessoas.
Os autores constataram que 95% das pessoas entrevistadas acreditam em Deus, mas têm visões muito diferentes sobre como ele seria. Cerca de 30% acreditam em um Deus “autoritário” (que se envolve com o mundo e julga). Perto de 24% acreditam em um Deus “benevolente” (que se envolve com o mundo mas não o julga). Quase o mesmo percentual acredita em um Deus “distante” (que não julga nem se envolve com o mundo). Cerca de 16% acreditam em um Deus “crítico” (que julga, mas não se envolve) na vida diária das pessoas. Apenas 5% responderam que não acreditam em Deus.
Para Frose, a moralidade já é um termo difícil de ser definido, por isso os sociólogos preferem usar “normas de comportamento.” A trapaça pode não pode ser vista como algo ruim em certos grupos, e mesmo o conceito de Deus evoca uma imagem diferente, para grupos distintos de pessoas.
O sociólogo da Universidade Baylor explica que, entre 1950 e 1990, os pesquisadores acreditavam religião estava morrendo e perderam o interesse pelo tema. Mas ultimamente isso mudou. Ele compartilha da posição de Shariff: há espaço para mais investigações acadêmicas imparciais sobre a ligação entre religião e comportamento.
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